quarta-feira, 27 de julho de 2011

Mitológico 1

adejo sob o sol. e perfurá-lo. A morte no claro, caro Ícaro, no calor. A chave para o labirinto não era a asa, nem o vôo e o que desfaleceu não foi a curiosidade, nem a beleza. Quando desafiaste o sem-saída, já reconhecias, não? Que ousado não é fugir e disparaste. Queda? Coragem. rápidos rapinos os teus desejos. Eras já parente desabido. Da morte. E subiste e desceste. Por fim, para a consoada. Nos mares.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

sofémento.

iconoclastando-me
e me vejo mais do que nu
vazio feito falta de ar.

de repente chega a dor
prova de que existo.

abençoada, a dor,
e sem o masoquismo,
eu a ultrapasso,
eu a atravesso,
e nela persisto,
cara amiga sem juízo.

E quantos campos abertos,
a possibilidade de tudo resistir,
de o mundo suportar na pele,
os poros, os grandes consoladores,
o suor, a chuva expremida do corpo.

dói não ter e não ser sido
perfeito.
E não será isso o que me faz mais forte,
o desumano?
e não é a ironia das formas que me apresenta a mim mesmo a face do meu rosto
e sou apenas esta pessoa
vaga, frágil, fracassada, limitada...

e por que não, ainda bem?

Hoje já sei sobre a morte
e aprecio o sofrimento
como um fiel à sua reza.

sei o quanto o ombros do universo podem despejar suas lágrimas sobre os meus olhos
e o quanto posso dormir nos pesadelos do mundo.

Não tenho mais medo,
e sinto a dor, constante
e sou vivo, se não a sentisse,
acaso poderia dizer

há razão na felicidade,
há razão no amor
a vida?

quarta-feira, 13 de julho de 2011

cronos remorrido

o passado com o segredo e cerrado, não libertará nada e nem irá facilitar nada, não recorrerá a parte de mim amputada e nem a que fica. O passado não se ausentará e nem será a utopia, e nem permanece como presente, suas línguas metálicas de semente perdida. O passado, moído, como a veste, trapo. hoje tudo pano e a pia ainda por limpar. O passado, a louça e os cacos - a sujeira do antes e do depois, e a fome. O passado, suas fendas, sua gastrite. e a contrição a vazios telúricos. O passado, este inseto, com suas asas sobrevoando o abisso e o pólem das estrelas como lama e inseticida. O passado, dorme em paz, que a saudade já foi foice, fica agora este aço, estraçalhado de sangue e d'arma. Sobrou-me apenas o deus no pulso e o tique-taque da terra. e ulisses sem in media res se suicidando. é tempo de colher luminosidades e apagar a vela negra das promessas sem rumo e além-ruínas.

terça-feira, 12 de julho de 2011

reflexões sobre a dor III - obscessivas.

1
O desejo é a música
dança pulsante dos que se amam
e se emudece o ritmo do compartilhar
quê nos sobra,
senão a solidão dos lagos
em que nada se move,
apenas os concêntricos
de nossas imagens
e seus desnítidos?

2
É preciso que eu me esqueça
para te esquecer.
Esquecer a parte do delírio
erigido pelo hábito.

esquecer o quanto
eu me fiz de ti
pra poder ser mais
do que a solidão.

o quanto eu criei
o futuro
para matar a ausência do passado
e as frágeis borboletas do presente em sussurro...

tão monótono-sempre.

É preciso que eu me livre
do tanto amar
todos os anos foram sombras,
as sombras que me seguiram
e aprendi a amar mais as imagens
do que as pessoas
e aprendi a cuidas de suas parcelas enterradas
amargamente no âmago
como um jardineiro regando com veneno
as plantas carnívoras.

É preciso, e quanto é preciso,
perder-me na minha própria reclusão,
ver os meus totens feridos,
arruiná-los
até mesmo o especular totem,
minha face, meu amor, meu desejo,
meu desespero de ser eu mesmo
e de ser em ti, em mim, em tudo.

em todos.

3
Sofre, Carlos,
sofre porque é o único jeito
de aprender a não sofrer mais
ou pelo menos
de aprender a sofrer sem tanto peso
porque nunca silenciará a dor
de não estar certo
mas nunca também a dor
de procurar
não estar errado.

4
Não sei sofrer
juízo triste que me faço de mim
não, não aprendi ainda
a passar pela dor
apenas revoluteei
por anos

tudo
sensível dentro do corpo
como se qualquer chaga
se tornasse uma ferida profunda
tornasse pela pele um pensamento de dias
como lâmina

Eis que chega a hora da dor
e eu finalmente a sinto
como dói não poder fugi-la
de olhos abertos observá-la
gradulamente exposta
em cada meu silêncio
e no desvio do esgar
e na areia da lágrima.

como dói saber
que não há nada que se possa fazer
não há como resolver
a ostra en que se fechou o passado
retirar dali uma pérola nova
que não seja este arpão-presente...

Não, é a hora da dor,
sem volta.
e não te ressintas pelo que não podes
e nem consegues controlar.

Apenas sofra.

Não és nem o amante
nem o profissional
nem o aristocrata
e nem mesmo o verme que te imaginas

és este meio
que continua vivo
e não há razão para tantas dramáticas emoções.

Permanecerás vivo,
porque as dores simplesmente passam
mas tu, antes e irresistivelmente,
perpassará primeiro
por elas.

reflexões sobre a do II - sobre o erro

1

A dor de errar.
Como é difícil
se olhar menos que um deus
e semprer mais e mais
que um humano.

2
Antes que se saiba
se ridículo,
comete-se erros absurdos
ri-se, chora-se
do si mesmo
e depois de inúmeros
enfeiamentos
muda?

Os mesmos erros, mesmíssimos risos,
As mesmas e novas tristezas.

E agora a careca.

3
O que é aprender senão isto,
a sucessão de erros
e a convicção
de que, ainda que se tente,
um descuido será a única resposta
para a total tentativa de controle.

reflexões sobre a dor I

1

dor do impulso
que não fere a carne
mas o pulso.

2

dor que foi o querido
e no que se perde hoje
no que se quer ido.

3

dor que é pena
e hoje é marca
tinta, papel,
caneta.

4
dor da trama
do outro
e de tudo que é
trauma.

5
dor de sua beleza
a magia, o encanto,
e o ser no canto.

6
a voz, dor vazia,
sem a pluma da transferência
de sorte que suscitaremos
o psicanalista.

7
Dor, aquela brecha,
vem e fura a flecha
e não dispara a saída.

8
Dor que é detida
de tida vida do conjunto
vai-se tudo junto
e resta-se apenas o sem.

9
A sombra do objeto perdido
permanecendo irresoluta
a haste do dedo absoluta
a cutucar...

10
O ser, a luta, a luta,
que é só adversário,
quando se é mais que um;
a dor é este hinário
a sagrados deuses mortos
e nenhum.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

per-passo

atravessar a dor
para que ela não me atravesse

estou pronto pra morrer
deixe-me apenas deitar

só o túmulo
faz a fênix.

dói,
e quem disse que não doeria?
e quem disse que a vida seria fácil?

debaixo de suas mangas
o passado na epiderme
o que sairá de si
será o verme?


pois venha
envenene-me a alma
mate-me até que a morte
nos separe

sexta-feira, 1 de julho de 2011

dor

1 -sentindo:

novo como folha
e seco à luz
até tornar-me areia.

2
este gouffre
que é a boca
de outro abismo

a vida é a estrela
ou talvez sua sombra brilhante

de eternidades passageiras...

3

é a morte
ou apenas a meia idade...
...
quanto queimo,
quanto ficarei grisalho?

4
sou um visionário lobo
e por isso o frio faz tanto sentido
minhas patas , onde deixar minha patas
neste gelo?
em qualquer parte.
meus pés apenas fincam o chão
deixo estas pegadas duras

sou pesado e só por isto consigo correr tão levemente

sou amigo do atrito.

balística

A lágrima salgada é doce
e dura como pedra
desliza pela face
e os meus poros rega

com o corpo se mistura
e se alinha alma
e numa urdidura
vai armando a calma

mas, como que tão dura
pode a gota lítica
se encerrar no corpo
tão alegre e rítmica?

Provavelmente sem nenhuma lisura.

- pela bela bala da balística obscura.