segunda-feira, 26 de abril de 2010
e eu que pensava que não era nada para o ar
descobri que até quem respira se importa
pois nada passa incólume
nem aquela rota derradeira em que já vejo os ossos longes as carnes distantes e as percepções
nem mesmo ela soube calar a voz daqueles que sofreram com a partida de um estrangeiro
sua despedida desconhecida as imagens de seu rosto esquecido e tão significativo
nem mesmo o obscuro de suas pegadas limpas pelos jorros das mangueiras
e nem aquela estátua que o olhava, abandonando sua vista eterna àquele que nunca mais voltaria
nada passa incólume
nem mesmo o desprezo da vela e sua pequena fumaça escorregadia
quantos séculos acesos e apagados e
em nossas ruas aquele casaco - experiência de vidas passadas pairando na silhueta histórica daquele senhor, seu semblante, sua boca em nós
e a história de seus parentes, sua língua murmurejante de instruções antigas,
suas músicas e os nossos estalos e assobios tão semelhantes e ainda distantes
mas capazes de surpreender aquele homem
e surpreender a nós mesmos
com seu calor insuportável e ancestral de ontem.
Não nada é incólume
nem uma boca ou espada
nem mesmo aquela fragrância dormindo apenas lembrança
do que uma vez foi existido
e as marcas e manchas por debaixo dos pedregulhos das ruas e suas lamas de detritos
e as gramas entre os paralelepípedos
e as indecentes proposta de urinar na rua, defecar nos grandes centros,
fazer amor no meio daquela grande avenida
nunca sequer realizados
mas o pensamento e a audácia residindo vivas
na manhã
quando o sol trouxe sua violância de queirmar
seu cheiro enegrecido e quente nas pólens
e sua virilidade sobejando por entre as colunas de mármores
abrasando os telhados, separando a neve do trigo
o joio das rusgas das aves
e as areias, do tempo
não nada é incólume
nem mesmo aquela luva por sobre a espema camada de pêlos
exaurida de calos, experienciada de emoções
de lamentos e arroubos
e o coração saindo em tornados
as patas de uma fera cruzando uma rodovia
no ilógico da vida
em seu desprotejimento
tudo para ir contra aquela cadeia de aço
lugar dos meus irmãos entristecidos
e seus olhos já eternizados em quadrados
porque aceitam a culpa que lhes foi imposta
suas sequelas indeléveis
como um gatilho
simples o ato de descer o dedo
apertá-lo
simples o ato de ser hoje inocente
e amanhã culpado
quando a culpa nunca existiu
porque nunca houve juízes
sequer advogados competentes
ou leis verdadeiramente não exclusivas
Não nada passa, passou incólume
nem mesmo aquele palito de dente
ou fósforo
que rolou quebrou os vidros, as traves
queimou casas, mansões, dias úteis
feriados prolongados
e até multirões de anos inconsoláveis
com seu peso deitado sobre os ombros e
o aviso de despejo
atrás da orelha
gritando adeus
nada passa incólume
nem mesmo o cansaço
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