terça-feira, 1 de setembro de 2009

nem mesmo névoa

pensou vários anos de sua vida numa mesma mulher. Dedicou cartas, poemas. Escreveu toda uma vida... o sentimento o entornava até nos vértices. Pensava em como seria se correspondido o amor. Um dia disse: quem sabe ela me amou? E perguntou-se se o pressuposto de "amou" é uma vez não ter amado. Entristeceu-se. Se ela um dia não soubera de sua vida, deveria não tê-lo amado. E se a eternidade dos amantes não é sempiterna, então, parte da vida dela, a moça sequer o conhecera. Ele, indiferente, um nada. Como? - ele se demandava.

Foi quando soube sem querer da terrível notícia, ela estava morta, o que significava que um dia toda uma vida construída em uma linha morrera em menos de um milésimo de anos de amor dele. A eternidade, então, onde ficou ela? Esquecida em que lugar?

No meu sonho eu o contemplava, o tempo era só uma noção estranha. Ele gritava: Beatriz, beatriz estás em algum lugar , no céu? e em algum lugar um zumbido comia em minha cabeça. Eu estava lá, vestido de mulher , quem sabe? Eu era eterno para ele?

Ele não sabia. Tudo inventado. Seu mundo, seu amor, seu tempo. Eu havia lhe dado e retirava agora a ilusão de vida. Eu era cruel. Trazia a realidade de maneira tão sutil a ele, como se machuca um corpo que, ao olhar a água, não pensa na dor do impacto que surgirá ao mergulhá-la.

Ele provavelmente me achara um deus. mas não o era. Quando o vi, ele tinha minha cara. e nós nos rebaixávamos um ao outro. ele me cuspia na face. eu queria apenas fazê-lo lamber o meu pus.

Desesperado, mesmo sabendo que tudo era fingido, Laivo acreditou poder criar para si a mulher que pudesse amar - retomar as hóstias gastas em tecer a imagem de Beatriz.

Teceu um fio longo, épico. que picotei. e num instante, sem a noção do tempo, ele que me parecera eterno um dia, sequer teve vida - eram inúmeros fragmentos que eu tentava montar para estabelecer uma linha.

Mas ele não se fixava,nem mesmo uma vez poderia, nem sua Beatriz qualquer cor possível do céu. Laivo era um borrão. Seu amor,vivaz, de talvez, no tempo, nem mesmo névoa. E sequer foi uma intermitência.

Tive que me contentar com sua provável inexistência.

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