sexta-feira, 14 de junho de 2013

enquanto cozinhamos...

o vinagre é óbvio,
o sangue também,
mas a vida só existe
na vista da farda
depois de averiguada
depois de apurada
em tubo de ensaio
politicial.

Torcida

torcida por,
para não ser torcida por,
nunca vi senão na política
um palmeirense gritar
vai corinthias

estatística.

ser ou não ser.

terça-feira, 11 de junho de 2013

Indizível.


Sem palavras.

...............................................................Apenas entrou.

A porta em seu ranger tranquilo. A casa. Foi se alojar nos fundos. Uma maçaneta que deveria ser regada a óleo, levemente dura, trincos na madeira já velha.
A cama, sobre ela o lençol. Deitou-se, o corpo frio da brisa que se encerrou pela noite. Deixar o corpo, enfim, cair. Era o que pensava. O calor das cobertas, o corpo pleno. Tudo vagaroso, o som da noite com seus ruídos ao longe, conversas de bares talvez, alguém rindo porque o dia a se acabar estala mais uma cerveja; um carro passando pela rua, a escuridão pela via, sem rumo e qualquer lugar uma chegada; uma luz pelo click do banheiro, uma canção no lábio soando pelo vidro, um banho longo como o tempo sem contas.
Apagou a luz do quarto e esperou o sonho. Os pés, após se debaterem um pouco (restos da pressa a se esquecer), finalmente dormiram. Um último som antes da última respiração. A luz da lua levemente entrando junto ao macio de um pequeno zéfiro solfejando. A mão sobre a pele, o travesseiro. O sonho.
O sol de sei-lá-que-horas. Apenas se levantou, o s dedos quentes no chão frio, alívio. Esticou as pernas vagarosamente e caminhou até a cozinha. Alguns afazeres: foi lavando a louça em círculos, uma péssima obrigação, mas naquele dia, algo apenas responsável, sem o peso real de uma verdadeira obrigação, assemelhante a um cuidado. Assemelhante como o lavar as roupas, o preparar da comida gradual, atento aos pequenos detalhes, ao sabor capaz de ser provocado pela combinação certa de ingredientes, o cheiro ascendente dos alimentos – a cebola e o alho ao fritarem com o chiado chamuscado; o corte rente dos legumes e carnes, o arroz o feijão e o rodopio do pino da panela, com sua loucura de temperaturas gigantescas, sem que se seja capaz de perceber o calor pelos olhos; toda a cozinha a se espalhar pela casa, enfim, como se a fome revelasse às paredes e móveis a diferença única da vida.
Sentou-se e comeu. Sentiu o gosto de cada alimento. Abocanhando tudo, triturando. As carnes as comia cada uma como um animal, sem pudores, sem fraquezas. Usava os dentes em seu ofício real, rasgava tudo com a voracidade necessária, puxava os interstícios mais duros, destruía. Os outros alimentos, porém, dava a certa atenção a todos, comia conforme a variedade dos humores dos alimentos: as frutas, sulcava-as, ferindo-as, gozando seu sangue nectaroso, abocanhando na medida certa, deixando escorrer pela barba o sem-querer líquido que escapava da boca. De resto, mastigava, a comida dura roia, quebrava, rasgava; os caldos assoprava e deglutia; tudo o que era mole, sugava com a boca para retirar o sumo e, após, fincava levemente o dente; comia e comia, aproveitando.
Era tudo solitário. Sozinho e o sol, o vento, o barulho das coisas, das casas ao lado, dos carros na rua ao longe, as pessoas a conversarem, música de quando em quando, violões, guitarras, baterias e depois o retorno sempre, o sempre retorno do silêncio.
E veio a chuva.
Caiu rapidamente e o som prosseguia infinito como pétalas de fogo de artifício. Em cada minúscula gota, vislumbrava cores e, ultrapassando-as, seguia o foco perdido de cada desregrado líquido. Além das águas, via as cores do asfalto, das placas lá fora, as cores da parede molhada, as cores vagas e perpassadas de velocidade de cada pedra de gelo que foi se formando e sentia a agressividade de cada uma das rajadas.
Pôs sua face sob o líquido. Deixou-se cortar, deixou-se machucar sem explicação. Os rubores nascendo como e os arranhares, machucados sem valor, sem precisão, contudo que faziam tanto sentido. Riu e apenas riu. Era um idiota, sabia. Se alguém o visse... A questão era: não havia ninguém. Fora dali, as pessoas, o trânsito, os chefes, o relógio, os problemas, a TV das lojas, compras, o capitalismo ou o algo mais que não sabia bem identificar que fazia cada singular momento não existir ou existir como uma conta, uma sempre conta ansiosa e rudimentar que nunca possuía solução, somente o acréscimo de números cada vez mais desordenados pela tentativa alucinógena de tudo tentar cercar, controlar, organizar, e retirar o lucro do ar, do abstrato, e do nada construir pontes, para onde, para nunca, para sempre e além?
Foi se secar. A toalha sobre o rosto, esquentando e diminuindo a intensidade do frio e das feridas. A chuva também se secava, tranquila. O mormaço subia.
Ficou nu perante o espelho, não se viu, não se observou, nem quis arrumar os cabelos. Não havia por que. Deixou-os emaranhar-se. Deixou-os desenvaidecerem-se. Os pelos endoidecidos, úmidos e irregulares. O corpo em seus contornos sóbrios, as cores evidentes, sem o disfarce das roupas. Balançou-se como um cão somente. E riu-se da possibilidade de poder ser um cão, farejar, roer ossos, levantar apenas a perna e mijar sem freios, sem dissabores, apenas mijar e sentir o quente descendo.
Mijou, pois.
E escorreu-se todo até que a urina fedeu seu suposto naturalismo. Inalou-se e era natural, se é que assim se podia dizer. E se dizia. Terminou e percebera que já era tarde.
Morava sozinho há alguns anos. E a sensação do dedilhar sobre a solidão. Sua solidão era seu sereno. E se escutava como música olhando paisagens. Suava pouco. E foi até o telhado.
A noite chegara e ele contando piadas. Deixava que o que tivesse que acontecer, acontecesse. O sutil campo de todas as coisas. O evidente de qualquer coisa que ali estivesse, despertado. Entedia o afeto de um religioso sem mencionar qualquer reza. E curtia a evidência óbvia dos objetos, das materialidades e imaterialidades. Sentia-se uma faísca.

O sono bateu-lhe sem dizer nada, como uma vela em sombras. Sem cinzas.
Entrava na casa. O despertador tocava. Ou saía, de onde aonde,

O silêncio somente sabia, se é que se sabia.

segunda-feira, 3 de junho de 2013

visão ultra borboleta.

A vida pela visão
de uma borboleta
enclausurada no vidro.

e comecei a quebrar espelhos
quando as imagens
só significavam
pelos cubos vagos
em areia solidificada

nunca vi algo vivo
pensei
ao olhar os quadros
do imóvel
meu

os cachorros continuam babando os frangos de padaria sem o sabor atingido.

II

a borboleta monárquica
porque os báculos e cetros
continuam a querer o mundo

a magia nas linhas da palma
sem qualquer laivo de magos
apenas os slides das marcas
borboletas no estômago
borboletas na hélice da mente

borboletas, como folhas, como pétalas, como chuva, como pó, pólen


borboletas - ou átomos.

e a poeira de seu voo despejada pelo futuro.

III

o doloroso
como uma borboleta leve voando.

antes éramos vermes apenas
agora que saímos
não saímos

somos produto
colorido envenenado
para polinização.